José Hiran da Silva Gallo
Diretor-tesoureiro do Conselho Federal de Medicina
Pós-doutor e doutor em bioética
É lamentável a inclusão no relatório da Medida Provisória (MP) que cria o programa Médicos pelo Brasil – recém lançado pelo Governo Jair Bolsonaro – de emenda que prevê o aproveitamento de 1.800 médicos cubanos que trabalharam no Mais Médicos, que foi criado pela ex-presidente Dilma Rousseff.
Esperava-se que o senador Confúcio Moura (MDB-RO), relator da proposta na Comissão Especial do Congresso que analisa o texto, barrasse a tentativa de alguns grupos que têm interesse em manter esses intercambistas atuando no Brasil. Infelizmente, ele sucumbiu à pressão de alguns grupos e agiu mais como político do que como médico com anos de exercício profissional.
Como médico, o parlamentar deveria – mais do que ninguém – reconhecer a necessidade de que a população seja atendida por profissionais bem formados e capacitados e lutar para que esse direito fosse cumprido. No caso dos portadores de diplomas de medicina obtidos no exterior, como os cubanos, não há preconceito contra o grupo. Todos são bem-vindos, desde que cumpram requisitos mínimos.
O que os médicos brasileiros e suas entidades de representação, como o Conselho Federal de Medicina (CFM), exigem é que eles comprovem sua competência ao serem aprovados em exames de revalidação de títulos que medem, de forma idônea, se os candidatos possuem conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias ao exercício da assistência. Se os candidatos possuem essas qualificações, certamente a aprovação seria simples. Assim, fica a suspeita de que tentam garantir acesso ao mercado brasileiro menos pelo mérito e mais pelas relações.
Para o CFM e os conselhos regionais de medicina, como o Cremero, a prova na qual esses candidatos devem ser aprovados se chama Revalida. Ela foi criada em 2011, por meio de uma ação articulada dos Ministérios da Educação e da Saúde, e confere em duas etapas – Avaliação Escrita e de Habilidades Clínicas – a amplitude do preparo de quem se formou em outro País, mas pretende ser médico no Brasil.
Detalhe: exames desse tipo e com essa finalidade são praticados pelas nações mais desenvolvidas do mundo, sempre com uma preocupação: oferecer ao paciente acesso a profissionais que atuem de forma segura e eficaz. Ou seja, não se trata de uma invenção nacional, feita para punir ou criar barreiras burocráticas. Se esses candidatos, tentassem fazer o mesmo caminho em direção aos Estados Unidos, Canadá, França, Inglaterra ou Portugal teriam de enfrentar filtros ainda mais rígidos.
Ao prever a inclusão dos cubanos, sem que tenham sido aprovados pelo Revalida, o senador Confúcio Moura e os parlamentares que com ele concordam aplicam a lógica do cidadão de segunda categoria para a parcela mais carente e vulnerável da população. Ou seja, em localidades remotas vale tudo: até disponibilizar para atendimento um “médico” que não tenha comprovado que entende mesmo de medicina. Mas será que em áreas nobres de São Paulo ou do Rio de Janeiro, pessoas com esse perfil poderiam atuar?