O que aprendemos com Brumadinho

 

José Hiran da Silva Gallo 

 

Diretor-tesoureiro do Conselho Federal de Medicina 

 

Pós-doutor e doutor em bioética 

 

 

 

Nesta semana, o Papa Francisco distribuiu comunicado onde comentou o acidente ambiental ocorrido em Brumadinho (MG), em 18 de janeiro. “Peço a misericórdia de Deus para todas as pessoas falecidas e, ao mesmo tempo, rezo pelos feridos e expresso meu afeto e meu apoio espiritual”. De forma sucinta, o pontífice expressou o sentimento que ecoa entre brasileiros e moradores de outros países, todos atordoados por esse desastre de grandes proporções.

 

Em Brumadinho, o número de mortes sobe dia-após-dia, com as descobertas que têm sido feitas pelas equipes de resgaste. Porém, os dramas provocados são muito maiores. Centenas de pessoas estão desaparecidas, o que torna incalculável o impacto dessas perdas nas vidas de seus familiares. Assim, ao longo do tempo, a tragédia se delineará na forma de traumas e chances perdidas, exigindo dos sobreviventes uma enorme força de recuperação.

 

No entanto, os lamentos manifestados por autoridades, cada um de nós e até por dirigentes das mineradoras não podem ser entendidos como o desfecho desse desastre. Há muito o que fazer. Ainda aguarda-se o anúncio das medidas para prevenir a ocorrência de outros incidentes desse tipo e o avanço das investigações para apurar e punir as responsabilidades pelo ocorrido, as quais devem transcorrer com isenção, critério e autonomia.

 

Sabe-se que a prevenção exigirá muito mais do que palavras. Especialistas no assunto reconhecem os limites do controle e do monitoramento de lagos para coleta de rejeitos de mineradoras, como o de Brumadinho. A jornalista Cristina Serra, autora de livro-reportagem sobre tragédia semelhante a atual, que aconteceu em Mariana (MG), em novembro de 2015, é taxativa: “a fiscalização em barragens é quase inexistente”

 

Segundo ela, que na época foi a encarregada pela maior parte do noticiário sobre o tema na Rede Globo, a Agência Nacional de Mineração (antes Departamento Nacional de Produção Mineral) não tem condições de fiscalizar as 663 barragens de mineração existentes no Brasil. “Era possível prever que acontecesse (outro rompimento), mas sinceramente eu não esperava que fosse em tão pouco tempo e numa magnitude tão grande”, comentou a jornalista.

 

Diante desse cenário, espera-se que, após dois acidentes consecutivos com grande repercussão, leis mais rigorosas sejam aprovadas e as instâncias para acompanhamento de sua execução recebam as condições necessárias ao seu trabalho. Da mesma forma, as grandes mineradoras devem adotar políticas de compliance para seguir as normas estabelecidas sem questionamentos.

 

Apesar de serem importantes agentes de desenvolvimento econômico, elas não podem estar acima das leis, inclusive daquelas que tratam sobre a responsabilidade na proteção do meio ambiente. Na noite de terça-feira (29), um sinal de que mudanças podem estar em curso veio em comentário feito por Fabio Schvartsman, presidente da Vale, companhia responsável pela barragem de Brumadinho.

 

Após reunião no Ministério de Minas e Energia, em Brasília (DF), ele declarou que a mineradora não conviverá mais com represas construídas com técnica igual a utilizada nos dois grandes rompimentos recentes em Minas Gerais. Afirmou ainda que a produção da empresa em locais onde existem estruturas assim será paralisada até que uma solução seja encontrada.

 

Por outro lado, além da prevenção, o País conta com a apuração e a punição de responsabilidades pelo ocorrido. A expectativa é de celeridade, evitando-se que uma percepção de impunidade se instale. Afinal, se estamos em um novo tempo político, faz-se necessário que a diferença seja notada por todos.

 

Dessa maneira, aposta-se numa ação efetiva e vigorosa do Governo, com as participações do Congresso, Judiciário, movimentos organizados e empresários, para eliminar as chances de que outros Brumadinhos e Marianas voltem a acontecer. Nesse sentido essas tragédias, apesar de toda a tristeza causada, terão deixado um legado importante para a Nação.

 

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