DANIEL CARLOS NETO   
*Advogado. Graduando em Medicina. Doutorando em Saúde Pública. Especializado em Direito Médico. Especializado em Direito Aplicado aos Serviços de Saúde. Especializado em Auditoria em Saúde. MBA Executivo em Saúde.     

De acordo com o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo – CREMESP – entre 2000 e 2015, foram criadas 142 escolas médicas, sendo 51 públicas e 91 particulares. No total, até julho de 2015, tínhamos 257 escolas médicas em atividade1, e coincidentemente no Superior Tribunal de Justiça entre 2000 à 2012, houve um aumento de 1.600% no número de processos judiciais (cíveis e criminais) envolvendo médicos.

Em pesquisa promovida pelo ESTADÃO em 2015, foi demonstrado que entre os anos de 2010 e 2014, o número de processos contra médicos que chegaram ao STJ – Superior Tribunal de Justiça – cresceu em 140%.2 Ressalta-se que esses números representam tão somente os processos remetidos ao STJ pela via recursal após decisão dos Tribunais de Justiça dos Estados, isto é, são casos já julgados nos tribunais estaduais que passam para a esfera superior quando uma das partes propõe recurso.

O crescimento de denúncias contra médicos também é percebido pelos Conselhos Regionais. O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo divulgou levantamento demonstrando que entre 2001 e 2011 aumentaram em 302% a quantidade de processos  ético-profissionais em andamento a partir de denúncias contra  médicos no Cremesp, relacionados a má prática, erro médico ou  infrações diversas ao Código de Ética Médica. Levando em consideração as duas penalidades mais severas, entre 2001 e 2011 o Cremesp cassou o registro de 164 médicos e outros 218  médicos receberam suspensão do exercício profissional3, veja-se:

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Ainda, de acordo com o Cremesp   

“Os processos e penas aplicadas estão relacionados diretamente à  má prática, muitas vezes consequência da má formação. Além da  deterioração do ensino médico, a evolução do quantitativo está  ligada ao aumento do número de médicos e à maior disposição da  população e dos pacientes em denunciar os supostos erros ou a má  conduta dos médicos.  O tempo de exposição profissional (anos de formado) está  relacionado com a possibilidade de o médico cometer erro ou  infração. Por isso, muitos dos médicos mal formados, graduados  recentemente em cursos mal avaliados pelo Exame do Cremesp ou  por outras formas de avaliação, podem não aparecer nas estatísticas de processos éticos. No entanto, estudos preliminares do Cremesp  levantam a hipótese de que têm aumentado o número de processos  e penas contra médicos mais jovens e aqueles formados em escolas  que têm obtido as piores avaliações.”  

Segundo Marcos Vinícius Coltri pelo simples fato de ser processado, o profissional, na maioria das vezes, tem de desembolsar quantia próxima a 25 mil reais, incluindo honorários advocatícios, custas e despesas processuais em geral, honorários de perito e do assistente técnico, etc.4 A autora Hildegard Taggessell Giostri, em seu livro “Erro Médico à Luz da Jurisprudência Comentada”, cita:

 No ano de 2003 deu entrada, em uma determinada Vara Cível de Curitiba/ PR, uma causa na qual um médico era acionado por danos morais e materiais em razão de quatro cirurgias cardíacas efetuadas em determinada paciente. A pequena “discrepância”é que o referido profissional era, e é, clínico, ou seja, nunca pegou em um bisturi. Está aí, cristalinamente evidenciado, não um “erro médico”, mas, sim, um “erro de paciente”, associado a um lastimável “erro de advogado”. É de se questionar quem, então, vai ressarcir os danos (morais e materiais) causados a este mesmo médico pela somatória daqueles dois “erros”? É uma questão que, sem a menos sombra de dúvida, merece uma séria reflexão. Neste caso citado houve uma simulação da paciente, que processou seu médico por tê-la submetido a quatro cirurgias cardíacas, sendo que este profissional jamais pegou em um bisturi, pois era meramente clínico. Alterou, maldosamente, quatro consultas e um eletrocardiograma para quatro cirurgias, e cirurgias cardíacas.5  

Partindo de uma análise crítica, percebe-se que o gerenciamento jurídico preventivo da prática médica ainda não é uma realidade para muitos profissionais, até serem surpreendidos por uma citação judicial.  Por esse motivo, a famigerada “Indústria do Dano” contra o médico e a própria realidade da medicina de per si, requer adoção da nova modalidade de proteção: a “Medicina Jurídico Preventiva”.  Com a devida vênia, uma simples e superficial análise das decisões judiciais, é suficiente para verificar que a falta de noções mínimas de Medicina, isto é, do tecnicismo muitas vezes imprevisível dos procedimentos médicos, por parte da Advocacia, Ministério Público e Magistratura, originam ações temerárias, defesas, pareceres e decisões equivocadas. Inclusive, muitas delas nem mesmo o Perito do Juízo consegue evitar, haja vista ser apenas um “órgão” do “sistema” do processo judicial.  Ademais, a falta de conhecimento técnico dos juízes para julgar casos médicos é um problema já reconhecido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que, em agosto de 2013, aprovou, por unanimidade, a Recomendação n.º 43, orientando os tribunais estaduais a criarem varas especializadas para processar e julgar ações que tenham como objeto o Direito da Saúde. Além disso, recomendou que as varas competentes priorizem os processos relativos à Saúde Suplementar.

Trata-se, no entanto, apenas de uma recomendação, mantendo-se a autonomia de cada tribunal para decidir sobre a instalação de uma ou mais varas especializadas. Desta feita, a análise do tempo de formação de um médico seja generalista ou especialista, com atuação liberal ou pessoa jurídica, leva à necessidade de se considerar a importância de uma permanente assessoria e consultoria preventiva especializada. Ademais, não se pode olvidar, consoante parcela da jurisprudência pátria, acolhedora da tese punitiva acerca da responsabilidade civil, que nem considera a linha tênue da Teoria da Imprevisão em que “O erro será inevitável. Mais cedo ou mais tarde fatalmente ocorrerá, e o esculápio poderá ser responsabilizado por isso. A questão não é só saber como ocorrerá, mas também quando. Só não erra quem não é humano. Só não erra quem não clinica. O erro involuntário é inerente ao homem e, por dedução lógica, é inerente a atividade médica”6.  Na atual conjectura, depois de instaurado o litígio com a propositura da ação em qualquer esfera judicial ou administrativa, só resta ao médico se valer do Princípio Constitucional do contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV da CF/88), o qual só alcançará sua plenitude quando extrapolar os limites da técnica do Direito Material e Processual, atingindo a esfera do Tecnicismo da Medicina.  Portanto, é tempo dos médicos refletirem sobre a realidade da Medicina Brasileira, e buscar proteger seus dois maiores patrimônios: NOME e DIPLOMA.   

 
NOTAS  
[1]MEC aprova abertura de 13 novos cursos de Medicina em SP. Disponível em: http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Jornal&id=2070. Acesso em: 05 de maio de 2016.  [2]Em 4 anos, número de processos por erro médico cresce 140% no STJ. Disponível em:http://saude.estadao.com.br/noticias/geral,em-4-anos-numero-de-processos-porerro-medico-cresce-140-no-stj-imp-,1655442. Acesso em 05 de maio de 2016.
[3]Ética médica. Disponível em : http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=NoticiasC&id=2574. Acesso em: 05 de Maio de 2016. [4]COLTRI, Marcos Vinicius. O médico e o custo para provar sua inocência. Disponível em : <http://www.ducatri.com.br/diferencial/rcp.pdf>. Acesso em: 05 de maio de 2016. [5]GIOSTRI, Hildegard Taggesel. Erro Médico à luz da jurisprudência comentada. 2 Ed. Rev. Atual.Ampl. Editora Juruá. 2011. p.34., [6]Barros Junior, Edmilson de Almeida. Direito Médico: A abordagem constitucional da responsabilidade médica. 2.ed. São Paulo: Atlas. 2011. P.44

 

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